Carnavale

Interessante ver que o carnaval nos últimos anos tem apresentado um novo módulo para o conceito "fantasia": A fantasia interpretada. Não duvido que esse carácter conceitual, de alguma maneira, sempre fez parte do conceito total, visto que tal é a expressão de interação social da vestimenta, na sua relação com o "outro" - como vemos no teatro, filmes, novelas e séries. Apenas percebo que é cada vez mais comum descolar a ideia de vestimenta da interpretação de um ato icônico seja ele "vexatório", "engraçado" ou "empoderador". O importante é passar a interpretação da mensagem (já conhecida) ao receptor tal como um ator (atriz).
Passeando pelas ruas vi interpretações, sem qualquer aviso prévio, de músicas e memes da moda. Faz sentido, eles são fáceis de decorar. Do nada, ouço alguém gritar "Bonito, que bonito! Que cena mais linda será que eu to atrapalhando o casalzinho aí..." (trecho da música "50 reais" de Naiara Azevedo). Logo um pequeno teatro é encenado com pessoas cantando a música ao mesmo tempo em que a interpretavam. Muitos foliões não estavam especialmente vestidos "a caráter" (ainda que houvesse pessoas vestidas simbolizando o resumo da música - segurando notas de 50 reais, com vestidos de noivas, maridos e amantes). Eis o bacana: reconhecermos a interpretação sem os símbolos de seu significante, e entendemos a mensagem. A fantasia se transforma na pura interpretação, na inventividade, na criatividade do receptor para fazer sentido. O receptor é a fantasia do mensageiro. E o mensageiro a fantasia do receptor.
E assim, muitos passavam pelas ruas interpretando outros momentos icônicos da nossa recente histórico de memes e videos da internet, como o BIRL de Kleber BamBam; a senhora correndo ao tentar ser entrevistada após bater ponto e sair do trabalho ("senhora, senhora... volta aqui senhora!"); a dança do gás; pessoas segurando barras ("essa barra que é gostar de você", trecho da música do Raça Negra); O "esquema" de relacionamento cantada por Anitta, Wesley Safadão e Nego do Borel com grupos de caminhantes cantando para os transeuntes "você pode ser, então, um pedacinho do meu esquema".

Enfim. Desses dias de delírio, apenas tenho a certeza de que o Carnaval é o teatro da vida interpretado incessantemente pelas ruas de todo o Brasil sem qualquer métrica, ensaio ou palco. Uma interpretação da vida como ela é, em que fingimos tão completamente, que fingimos que somos atores do palco que deveras vivemos.

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