"Fulana, tenha calma".
Mas você não está nervosa. Sequer irritada. Remotamente perturbada. Ou aparenta qualquer expressão facial que demostre isso.
Parece academicismo pensar em teóricos e filósofos todos os dias na fila do pão, mas quando reflito sobre essa fala me vem a cabeça Foucault e o processo de docilização do corpo social. Ainda que não tenha abordado a perspectiva do cotidiano de maneira direta, ele ajuda a pensar os dispositivos de controle e poder que nos cercam. E como eles são sutis, invisíveis, disfarçados, faceiros. Delicados como uma sugestão, eficazes na mensagem imperativa, entre a pena, o cuidado e a força.
Assim parece, pois quando mulheres, negros, indígenas, minorias, etc. são qualificados negativamente como frágeis, incultos, ignorantes, são imediatamente rebaixados e redimensionados a categoria a ser controlada (ao dispor de tais mecanismos), pois conter um "corpo" é deixar/impedir que "outro" avance, tome partido e decisões.
Fulana, tenha calma. Que calma é essa? De onde vem a calma, como diria a música? A calma é um constructo implícito de controle? Quem pede calma já dá a tônica da ação.
Contenha-se antes de ser contido.
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